domingo, 21 de abril de 2024

Indispensável

PINTURA DE PEDRO CHORÃO EM SETÚBAL | É um grande privilégio para a cidade receber uma exposição de Pedro Chorão na data em que se comemoram os 50 anos da revolução. É a segunda vez que este artista único expõe em Setúbal. Em setembro de 2019 mostrou, na galeria da Casa Da Cultura, trabalhos em papel que povoaram aquelas paredes com o rigor e inteligência que só assistem aos grandes artistas. As imagens que aqui estão são dessa ocasião.


Agora são telas de grande formato que preenchem os espaços da Casa. Convidei a artista visual e professora Ana Nogueira para explicar na Folha de Sala o que vê quando observa o trabalho de Pedro Chorão. Chamou ao seu texto "Próximo da Noite". Texto surpreendente na descrição dos ambientes sugeridos nas telas. Parece que há música ali. E há.

Eu estou a olhar para os quadros e ainda nem sei o que dizer. O espanto absorve-me, mas já tenho título para o texto: "O que dizer, quando o que se vê diz tanto".

E pronto, na próxima quinta-feira, dia 25, vamos descer a avenida em alegria por Abril e depois vamos rumar a Setúbal para estarmos com Pedro Chorão e o seu trabalho recente. Abril também vai estar aqui. Sempre!
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PEDRO CHORÃO
PINTURA

Abril/Maio. 2024
Abertura: 25 de Abril. 19 horas
Casa da Cultura | Setúbal. Galeria e Espaço João Paulo Cotrim





sábado, 20 de abril de 2024

Tiago Rodrigues: na medida do impossível

"Catarina e a beleza de matar fascistas" é um marco na cultura teatral contemporânea. Corre mundo, e ainda bem. O surgimento de novos fascistas, agora já sem botas cardadas, mas sim muito arranjadinhos, com roupas de marca e muito bem preparados — Os melhor preparados de sempre, dizem os especialistas e analistas de serviço — desperta-nos para atitudes de rejeição dessa nova ordem, mas encontra-nos no território de uma estranha razoabilidade, onde tudo nos é apresentado como normalizável. Não é. Não pode ser. O final da peça é uma surpresa que se entranha de imediato.

Em "Na medida do impossível" estamos no centro do conflito. São relatos amargos e tristes, mas que tentam encontrar a esperança. Tiago Rodrigues  é um mestre desta nossa maneira de olharmos o mundo. Nós achamos que estamos atentos, mas ele vai mais além. Mergulha em todas as impossibilidades. Todos os atropelos à existência são interpretados aqui de uma maneira tão lúcida que nos faz olhar com maior compreensão para o que ainda não tínhamos percebido, absorvendo-nos num imenso manto de derrota. Ficamos surpreendidos com as situações limite. Muitas definitivas. O sofrimento e a morte devido a guerras insistem em existir para gáudio dos novos imperadores.

"Catarina e a beleza de matar fascistas" e "Na medida do impossível" são peças sobre o triunfo de um aparente imobilismo que nos quer encontrar derrotados e tristes. Mas Tiago insiste em alertar-nos. Só podemos agradecer-lhe.

Assisti às representações destes dois monumentos culturais em tempos diferentes, como é evidente. Na passada sexta-feira fui à Culturgest. Mulheres e homens de grande qualidade artística e intelectual subiram a este palco de denúncia e revolta. "Um murro no estômago", dizia-me um amigo à saída. Com razão. Mas saímos dali mais crescidos. Com mais vontade ainda de percebermos o que nos está a acontecer. E reagirmos. Não nos peçam para frequentarmos espectáculos manhosos dos Emanueis, Clementes, Toys ou Carreiras. Mais murros na cabeça não, por favor.






Na medida do impossível

Encenação e texto

Tiago Rodrigues

Interpretação

Adrien Barazzone, Beatriz Brás, Baptiste Coustenoble, Natacha Koutchoumov

Música ao vivo

Gabriel Ferrandini

Tradução

Thomas Resendes

Cenografia

Laurent Junod, Wendy Tokuoka, Laura Fleury

Composição musical

Gabriel Ferrandini

Luz

Rui Monteiro

Som

Pedro Costa

 

Colaboração artística, figurinos

Magda Bizarro

Assistente de direção

Lisa Como

Produção

Comédia de Genebra

Coprodução

Teatro Nacional D. Maria II – Lisboa, Odéon-Théâtre de l'Europe, Piccolo Teatro – Milão, Équinoxe – Scène nationale de Châteauroux, CSS Teatro stabile di innovazione del FVG – Udine, Festival d’Automne à Paris, Théâtre national de Bretagne – Rennes, Maillon – Théâtre de Strasbourg scène européenne, CDN Orléans / Centre-Val de Loire, La Coursive – scène nationale de La Rochelle

Colaboração

Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Médicos sem Fronteiras


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A montanha pariu um monstro


Não dá para perceber. Não dá para respeitar. Não dá para tolerar. Um governo com maioria é derrubado, provocando uma crise política. Vamos para eleições, e muda tudo. Forma-se outro governo que vai no sentido oposto ao do governo derrubado, mas com exactamente o mesmo número de deputados a apoiá-lo do que o do partido maior da oposição. Cresce uma força política que roça a delinquência. Força essa que aliada ao novo governo pode mudar tudo provocando medidas políticas delinquentes. Os grunhos saem dos buracos em delírio. Parece que assim é que é. Vamos voltar ao passado. Mulheres podem ir para onde quiserem, mas de preferência para as lidas do lar. Pessoas sexualmente diferentes dos grunhos devem voltar para o armário. As medidas anunciadas que tanto animaram os debates é melhor serem esquecidas. Vamos voltar à normalidade da direita: polícias para a rua para arrear no cidadão. Políticos para o parlamento para aliviarem os atropelos ao capitalismo desenfreado. Quem ganha mais quer ganhar mais ainda. Vamos nessa. 

As conclusões agora reveladas mostram o sarilho provocado pela extremosa Justiça. Nada se confirma, tudo foi um embuste. Tudo isto aconteceu por mor de um "descuidado" parágrafo que uma senhora da Justiça escreveu, diz-se. Foi? Se calhar foi mesmo o parágrafo, mas a senhora não se enganou. Não houve aqui descuido nenhum. Desta vez a montanha não pariu um rato. Pariu um monstro. Vamos estar em confronto com um passado que pensávamos mais arredado do pensamento das pessoas. Estávamos enganados. Os monstros andavam escondidos nas histórias contadas passadas antes de 25 de abril de 1974. Agora andam aí de novo sem vergonha na cara. Dizem o que querem e fazem-se ouvir. Estão 50 fascistas no parlamento, fora os que ainda não sairam das gavetas infectas. 

E a senhora que provocou isto tudo não se demite?

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sexta-feira, 19 de abril de 2024

Receituário

Está tudo a acontecer. Celebra-se a Liberdade. Liberdade de pensar, falar, adquirir conhecimento sem censura. Proibir é proibido. Conhecer é fundamental.
PADRE FELICIDADE - O oposicionista praticante

Receituário

Está tudo a acontecer. Celebra-se a Liberdade. Liberdade de pensar, falar, adquirir conhecimento sem censura. Proibir é proibido. Conhecer é fundamental.

CONVITE | INAUGURAÇÃO
20 ABRIL 16H00
HENRIQUE RUIVO
O BOATO
obra gráfica e pintura
É com muito prazer que convidamos para a inauguração da exposição de Henrique Ruivo «Boato», Sábado, dia 20 de Abril, a partir das 16h, na Tinta nos Nervos.
Este ano celebramos o 25 de Abril e os 50 anos do começo da vida democrática no nosso pais.
A exposição «Boato» de Henrique Ruivo integra as comemorações desse momento fundador na Tinta nos Nervos. Nascido em plena ditadura, no Alentejo, Henrique Ruivo (1935-2020) deu voz no seu trabalho gráfico e plástico ao combate pela liberdade, à resistência e à aspiração por dias melhores. Os trabalhos em mostra datam sobretudo da década de 1970, com particular incidência no período revolucionário e anos posteriores, quando pintura e obra gráfica se contaminaram. Reúnem-se projectos gráficos realizados em diferentes contextos (da pesquisa artística à intervenção, à contestação) e em diversos suportes: Ilustração, Cartoon político, Caricatura, Propostas gráficas para Jornais, Revistas, Livros (capas para múltiplas editoras), Autocolantes, Capas de discos, Cartazes, Serigrafias, Pintura e Escultura.
TINTA NOS NERVOS
Terça a Sexta, das 11h às 19h; Sábado, das 11h às 18h
Encerra Domingo e Segunda

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Notícias do buraco


OLHA O PASSARÃO | Passos Coelho segue as pisadas de Trump. O que importa é ele, o próprio, quem vier a seguir que feche a porta. É a ira do ressabiado. Passos não perdoa à esquerda aquele arredamento do poder. O pote ficou longe. Agora, com Montenegro, a coisa está a correr mal. Já podiam estar contentes e confiantes, caso o actual líder do PPD/PSD experimentasse um aconchego com o javardolas fascista. Com 50 energúmenos no parlamento aliados aos nossos só podia correr bem. Cordões sanitários? Que merda é essa? É limpinho que entre os deputados do partido de Passos/Montenegro ainda há muitos energúmenos que apoiariam a javardice. Basta olharmos para os "social-democratas" eleitos na anterior legislatura, transladados agora e eleitos
pelo partido fascista. Esqueceram a social-democracia. Aliás, nunca foram social-democratas. Mal perceberam que ali não tinham hipótese de lucro político, viraram-se para o partido do grunho falante. O grunho não vai largar o rebanho de que se afastou. Ele só pensa em fazer crescer o partido fascista.

Passos Coelho é um político extremamente calculista. Muito mais inteligente do que Ventura, vive na tentação de meter o fascista no bolso ou eliminá-lo. A sede de protagonismo político cega-o. Alinha com quem for preciso para saltar para o estrado da pouca-vergonha. Agora o que é preciso é cavalgar esta onda em que a democracia permite que se apreciem fascistas. O "povo de direita" quer liberdade. Queixam-se em páginas de livros e em outros mediatismos. Não lhes falta quem os faça ouvir, mas queixam-se na mesma. Querem liberdade para o povo de direita. O que será isso? Não se percebe: quem é que lhes tira a liberdade, a eles, que querem o impensável e dizem-no já sem que a vergonha os iniba? As mulheres devem ser o que a bíblia sagrada decreta. Vão para as cozinhas porque só elas sabem servir maridos e prole. Ainda iremos assistir ao regresso do chefe da família do Estado Novo: ela manda em casa, mas quem manda nela sou eu. Meninas de cor-de-rosa, meninos de azul. Tradição é tradição, Vamos lá acabar com essas modernices hippies e esquerdistas O lugar da mulher é na lida da casa. O homem tem mais que fazer. Tem responsabilidades que exigem esforço e saber masculino. Faz sempre falta um homem em casa. Para quê? Olhem, para mandar nas mulheres. Há lidas que não são para os homens. Exemplo? Acham bem que uma mulher assista a um jogo de futebol pela televisão, com uma gamela de tremoços em frente, cigarro na boca e cervejolas por todo o lado? Alguém lava melhor a loiça do que uma mulher? E gostam de ver um homem a passar a ferro, hã?! Bem, as mulheres tirarem a carta, até não está mal pensado. Elas têm muito mais jeito para irem buscar os putos, perdão, os meninos à escola.

Em entrevista à inefável senhora dona Avillez — parece que aquilo se chama Rádio Observador, deus lhes perdoe —, disse o que lhe passa por aquela cabecinha outrora ornamentada pelos cabelos pintados em tons apreciáveis pelos frequentadores do mais inenarrável gosto, mas agora ausentes. Passos Coelho assume o papel de troglodita de serviço, o que denuncia a sua conhecida e agora reeditada ambição. O ódio que decidiu adaptar ao seu discurso taralhoco prende-se com a estratégia de se dar a conhecer como realmente é. É que já há muitos como ele a saírem dos buracos infectos de ranço. Tem apoio. Não se cala e avança com impropérios incivilizados porque sabe que há muitos cretinos que pensam como ele. Passos Coelho não quer ser um troglodita como Trump ou Bolsonaro. Tinha a criatura que criou para desempenhar esse papel. Mas Ventura cresceu muito. Está um fascista feito. É o seu orgulho. E então não lhe ocorreu mais nada. Deu-lhe para ali. Logo a ele, que não era crente. Será que já é? Será que é ele próprio o porta-voz do povo preferido de um deus menor que dita regras restritivas e serôdias? O megafone é dele. Veio para ficar. Quer ser tudo: justiceiro, ajustador de regras, salvador dos fiéis ao pote. É um maçador. Cansa. Fede. Quer tramar quem felizmente não pensa como ele. Não se pode exterminá-los? Não se pode eliminar a esquerda?

Não, Passos passarão. Não passarão.

terça-feira, 16 de abril de 2024

Eles estavam cá

Como viveram a revolução os estrangeiros que estavam a trabalhar ou a estudar em Portugal?

Vamos conversar com professores ingleses, e portugueses que entretanto foram para Londres, mas que em 1974 estavam por cá, e por cá viveram intensamente aquele tempo fascinante.
Vieram a Portugal quando a revolução fez quarenta anos. Vêm agora de novo, de propósito para comemorarem conosco os 50 anos da revolução. O encontro está marcado para dia 26 à noite, na sala José Afonso, da Casa Da Cultura | Setúbal. Vai ser bom.



segunda-feira, 15 de abril de 2024

50 anos de liberdade - Design de comunicação (3)


BOCAGE - BODONI | 
Foi já no ano de 1994. A liberdade e a democracia já contavam vinte anos. Resolvi inventar uma relação de amizade entre Bocage e Bodoni. Propus a ideia para que se integrasse nas Festas Bocageanas que se realizam sempre em Setembro. O Departamento Cultural da Câmara aceitou e deu todo o apoio. A coisa fez-se.
Claro que Bocage nunca conheceu Bodoni. Tudo isto foi inventado. Mas de facto foram contemporâneos. E poderiam perfeitamente cruzar-se nas actividades que desenvolveram. Um poeta/escritor, outro autor tipógrafo. Bodoni criou a tipografia que tem o seu nome. Tipo de letra com uma eficácia e elegância que ainda hoje permite recriações e utilizações ousadas. Também a grafia dos nomes animou grafismos. BOCAGE/BODONI têm o mesmo número de letras, separados pelo mesmo número de sílabas e começam ambos por B. Encontro marcado: Bocage conviveu com Bodoni, em Setúbal, naqueles dias de setembro e outubro de 1994.
Foi convocada muita gente que generosamente correspondeu com mais ideias. Eu apresentei a ideia inicial à Inês Lamim e à Marta Dias, e depois ao Departamento de cultura. Desenvolvi a ideia em dez ampliações de composições de letras do tipo Bodoni, em telas quadradas com dois metros de lado, que foram instaladas na Casa Bocage, na altura galeria de arte. Foi também na Casa Bocage que a Marta Dias cantou poemas de Bocage, musicados por ela para o evento, acompanhada por Dimas Pereira. Miguel de Castro leu poemas. O Rui Mesquita e o João Costeira fizeram, na Biblioteca Municipal, uma performance em que inventavam um diálogo entre Bodoni e Bocage. O ambiente foi descontraído e divertido.
Tudo isto ficou documentado em publicação — aqui mostrada na imagem — incluindo textos de Inês Lamim, que "explicou" esta amizade entre poeta e tipógrafo, e Álvaro Arranja, insistindo na ideia de liberdade na poesia de Bocage.
A exposição ainda viajou até Parma, onde experimentou as paredes do Museu Bodoni.
Foi assim. Foi bom.

domingo, 14 de abril de 2024

P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.
António Aleixo
O EMBUSTE | Afinal parece que a redução do IRS deste governo é igualzinha à do governo anterior. Certo, há ali mais uns raminhos de demagogia, mas isso só prova a ideia de Aleixo. Montenegro prometeu o mundo e mais uns planetas e agora tenta esconder a mentira com uma peneira. A direita mente sempre muito mais do que esquerda. É matemática. Ou simplesmente aritmética, vá. A direita é sempre trauliteira e desonesta. Nunca são os interesses das pessoas que norteiam os extremosos políticos que se colocam ao serviço do povo. É apenas a economia capitalista sem freio que conta. A mentira é a táctica.
A extrema-direita contesta a direita dita civilizada, é claro. Com esses fascistas ficava tudo resolvido em menos de um fósforo. Suspendia-se a democracia por uns momentos, e os mais necessitados, ou os mais exigentes, que fossem morrer longe. A extrema-direita é pior do que a direita tradicional, apesar de cada vez mais frequentemente serem muito parecidas. Unidas podem fazer muita trampa.

sábado, 13 de abril de 2024

Receituário

Está a acontecer. Até já.



Eles andam aí

"Actualmente, negamo-nos a ver o retorno do fascismo. Dizem-me que do que eu falo é dos perigos do populismo. Não é nada disso. O populismo é como os mosquitos, um pouco irritantes. O perigo real é mesmo o retorno do fascismo. O fascismo é o cultivo político de nossos piores sentimentos irracionais: o ressentimento, o ódio, a xenofobia, o desejo de poder e o medo. Não deveríamos confundir conceitos. Devemos chamar o fascismo pelo nome”. 

[Rob Riemen, ensaísta, filósofo e diretor do Nexus Institute]

Rob Riemen é um pensador que nos alerta para este perigo. Li o seu "Eterno retorno do fascismo" e nunca mais me calei. Recentemente deu esta entrevista. Insiste no que o preocupa. O homem sabe o que diz. Tem razão. Estamos em tempo de combate ao fascismo. Não há outro nome a dar a isto.

Os fascistas saíram dos buracos. Andam aí e já sem vergonha. Lançam livros até há pouco tempo impensáveis, formam movimentos de uma "ética" deplorável que anseiam por incutir nos incautos, falam abertamente sem medo do ridículo. Eles percebem que há muitos ridículos como eles que podem constituir normas de poder ridículas, que depois de aplicadas passam a ser criminosas. Os fascistas não prestam. Vivem da tentativa de instalação do medo. Só pensam em tolher, nunca a fazer crescer. 

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Não passarão

Era evidente. Aquela sentença não fazia sentido nenhum. Condenar alguém que denuncia um criminoso é um absurdo. Quem condenou não se enganou. Fez o que lhe baila na cabeça. Os tempos sopram a favor desta gente. É bom perceber que ainda sopram bons ventos. Combater a extrema-direita racista, xenófoba, sexista, fascista, é uma obrigação. Os fascistas não se normalizam. Não são normais. Os fascistas combatem-se. Sempre.

Um abraço, Mamadou.

sexta-feira, 12 de abril de 2024

Falar de quem fez Abril


Não foram os militares que fizeram (sozinhos) a revolução. A revolução aconteceu porque a população acrescentou vontades e atitudes. E também houve quem interpretasse esse tempo com textos (históricos e jornalísticos) e imagens. Este ano em que o 25 de abril faz cinquenta anos, vamos recordar quem melhor descreveu o que se passou acrescentando opinião e atitude. Um dos mais notáveis opinadores desse tempo portugês foi João Abel Manta. Os seus
cartoons são história. Abel Manta interpretou como ninguém o período fascista de Salazar e depois a vontade das pessoas de fazer futuro. A exposição que está no palácio Anjos é antológica. Grandiosa. Vamos falar da exposição e do catálogo. Mais de trezentas páginas de documentação artística banhadas de excelente grafismo.

A exposição recomenda-se. O catálogo pode ser adquirido por um preço único e irrepetível. É hoje à noite, na Casa Da Cultura | Setúbal. Até logo.

quarta-feira, 10 de abril de 2024

A bem da ração


Percebo a noção de família da família fascista. Percebo que não queiram qualquer um lá por casa a estragar as alcatifas e a lambuzar as pratas. Percebo que percebam as mulheres que queiram ficar em casa a tratar das refeições e a lavar as cuecas deles (na máquina, é claro), e percebo que não andem para aí a fornicar a torto e a direito com este e com aquele, como os cães. Percebo, a sério.
Como não li o livro (nem vou ler), logo não percebi se os cães podem fazer parte de uma família às direitas. O meu faz. Mas a minha família alinha pelas esquerdas. E não o trocava por nenhum dos frustes escritores do livro fascista. Ele também não. A bem da ração. Estes neofascistas querem um regresso a um passado inimaginável. São abaixo de cão. Vão dar banho ao cão. Viva o meu cão.
[Fotografias de Óscar Silva]

Fotografias de Óscar Silva.

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terça-feira, 9 de abril de 2024

A pés juntos

Juro a pés juntos que não queria comentar o livro manhoso que este estropício apresentou. Mas a clientela rançosa que ali se amontoou para o ouvir dizer inanidades, mais as inanidades que ele disse, e mais a cobertura que teve, levam-me a vazar para aqui aquela frase do filme "O Testa de Ferro", em que Woody Allen enfrenta um colectivo de juízes. Lembram-se do que ele diz ao altivo júri que o julga e condena? — Vão-se todos foder!

É isto.

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segunda-feira, 8 de abril de 2024

Falar de abril

Este ciclo de conversas sobre os 50 anos do 25 de abril pretende abordar o que de mais relevante se fez antes e depois, numa perspectiva de reconhecimento da qualidade da intervenção dos protagonistas desses tempo, que é também o de agora. João Brites foi o primeiro convidado. Conversou com Luana Gonçalves, estudante e entusiasta das coisas teatrais. João Brites, resistente ao fascismo, exilado, e depois grande praticante da liberdade de fazer teatro de grande qualidade, deu uma brilhante aula de cidadania. Luana aprendeu com a lição de Brites, e ensinou-nos outros envolvimentos e percepções. Esta sessão foi mesmo um espanto.

Nesta sexta-feira vamos conversar sobre João Abel Manta e o seu trabalho. João Abel Manta é o artista que melhor interpretou aquele tempo em que a repressão foi eliminada pela revolução. Interpretou como ninguém um certo sentir português. Vamos falar com os responsáveis pela monumental exposição montada no Palácio Anjos em Algés. Conversaremos com Mariana Manta Aires, Pedro Piedade Marques e Jorge Silva. Eu vou estar lá a conversar com eles, e acredito que vou sair dali uma pessoa melhor. Tudo isto se passa na Casa Da Cultura | Setúbal. Apareçam.

domingo, 7 de abril de 2024

Design de comunicação


Assim de repente toda a gente se tornou especialista em imagem, mas também aconteceu que especialistas em imagem se tornaram toda a gente.
Explico melhor. Era uma vez um governo de um pequeno país, que, percebendo que a comunicação visual era importante, e que muitos outros países já estavam a perceber isso, resolveu encomendar uma imagem que ilustrasse esse país de uma maneira mais contemporânea, mais sofisticada, mais adaptável aos novos meios de comunicação.
Depois de muitas consultas e percepções do que se anda por aí a fazer em imagem e comunicação, foi entregue a um dos mais competentes estúdios de design — é assim que se classifica a actividade profissional que faz essas coisas — uma interpretação visual mais consonante com a realidade em comunicação visual nos nossos dias. Tenho a certeza absoluta de que o estúdio que desenvolveu esse trabalho fez um apurado esclarecimento dessa realidade, atribuindo um complexo trabalho de investigação e aplicação em suportes, a uma competente equipa de profissionais. Isso percebe-se pelos desenvolvimentos apresentados. Tudo foi previsto. Todas as aplicações foram testadas. Foram feitas maquetas, estudos teóricos, testes práticos, Foi até desenhado um tipo de letra específico, por um dos melhores profissionais da disciplina.
O trabalho foi apresentado ao governo do país que o passou a aplicar nos suportes institucionais. O governo aplicou-o, com justificado orgulho, diga-se, já que todos os estrados do esclarecimento político passaram a ter outro ar. Um ambiente visualmente mais asseado e sofisticado passou a morar nos ecrãs televisivos e nas páginas dos jornais. O país parecia outro. Visualmente, pelo menos, mas na prática denota um comportamento também melhor, mais inteligente e de mais confiança.
Sol de pouca dura, diria o povo. Um estardalhaço provocado por extremados juízes pôs em causa o governo. O governo caiu e foram convocadas eleições. As eleições foram democraticamente um desastre. Adeptos de ajustes frustes quadriplicaram representação no parlamento, e os reais vencedores formaram um governo cagarola que se rende aos auspícios dos frustes ajustadores. A nova imagem desse país foi por água abaixo, e os cagarolas — os cagarolas são básicos e ignorantes — foram buscar uma bonecada parola que já tinham usado quando em tempos foram governo, piorando ainda mais aquilo, acrescentado informação visual ao que já por si era excessivamente medonho. Os parolos que entretanto tomaram posse como membros do governo parolo, mandaram o mais parolo dos ministros anunciar a medida. O ataque à dignidade dos designers e artistas visuais foi a primeira medida do governo dos parolos.
Claro que nem todos os que votaram nos parolos são parolos. Mas muitos são, e os ajustadores frustes — que são 50 imbecis que ocupam o lado extremo direito — ficaram radiantes. Mas muitos comentadores acharam todo este comportamento excessivo. Há excessos verbais à direita e à esquerda. Toda a gente acha que fala com propriedade do que observa. Há casos caricaturais. Um ex-líder do partido que formou governo e que ocupou funções de topo na Europa veio dizer que as quinas eram indispensáveis. Pasma-se. O homem continua a confundir logótipo com bandeira. Não aprendeu nada na Europa. O líder do tal partido fascista que agora tem 50 deputados no parlamento chegou a dizer que usa as quinas nas cuecas. Um imbecil não tem noção de que é imbecil, mas confundir o aconchego das partes baixas com patriotismo é todo um programa de governo para ele, o imbecil.
Mas à esquerda também foram acrescentadas razões que desmentem a razão. Designers insultaram este trabalho como coisa simples em excesso, vulgarizando assim uma ideia que já inundava as redes ditas sociais. Muitos até usaram a clássica expressão: isto também eu fazia. Outros, mais idiotas, acrescentaram a sua expressão de bondade: eu, por esse preço faria melhor. O custo, que em qualquer dos outros países onde a imagem foi melhorada foi muitíssimo superior, foi outro atropelo à aceitação da coisa.
Mas também os desenvolvimentos a partir da ideia do trabalho original, vulgarizando a execução, transmitindo a ideia de facilidade técnica, não me parece uma boa reacção. Não se trata de plágio desavergonhado. A origem é assumida e a ideia está bem trabalhada, mas é pouco correcto para com o trabalho original que não é feito assim com três pancadas. Essa aplicação foi feita e foi muito partilhada, como boa ideia de esquerda contra a direita serôdia. Não me parece nada uma boa ideia, apesar de ter a sua graça. Acontece que o tempo não está para graças.
Esclarecimento final: penso que já perceberam de que país falo. É esse mesmo, o país Portugal. E acrescento que não espero nada de um governo que revela um tão elevado grau de cagarolice para com a extrema-direita incivilizada e ridícula.
No próximo dia 25 de Abril vamos para a Avenida da Liberdade dizer-lhes que não fazem cá falta nenhuma.
Termino com frases de uma canção do meu amigo Sérgio Godinho:
Ai, Portugal
dar-te conselhos é bem pouco original
(mas) se realmente não quiseres querer-te mal
olha p´ra ti, ó Portugal
e não te deixes assim vestir

sábado, 6 de abril de 2024

Receituário


PINTURA DE PEDRO CHORÃO | Vai ser o artista de Abril e Maio na Galeria da  Casa da Cultura. É uma honra recebê-lo aqui pela segunda vez, depois da sua exposição de 2019, onde foram mostrados desenhos e pinturas em papel e colagens. Agora são telas de generosas dimensões. 

Pedro Chorão usa as telas e as tintas para pensar. Olha em seu redor e tenta perceber a paisagem. Gosta do que vê. Muitas vezes sem olhar o exterior. As figurações residem dentro da sua cabeça. Aperfeiçoa essa realidade acrescentando pinceladas que formam fundos graficamente densos. O pincel percorre a tela e desenha paisagens imaginadas. A natureza escorre por estas páginas de um grande livro, aparentemente sem palavras, mas que tanta conversa nos sugere. Pedro Chorão tem uma obra imensa. Se ficarmos atentos à sugestão do artista, e circularmos em passo de passeio, encontramos histórias de lugares que correspondem a registos guardados na nossa imaginação. Sonhos, talvez. Podemos ficar horas a olhar estes trabalhos. Circulamos por entre estas telas com a satisfação dos percursos prazenteiros.

Trabalhos que nos suscitam a surpresa e nos instalam a dúvida sobre o que procuramos, quando observamos uma obra de Arte. Parece-me que em Pedro Chorão encontramos a liberdade. Uma liberdade total que nos transmite conforto visual, mas também inquietação. É bom olhar estes trabalhos, apesar dessa inquietação. Aliás, é mesmo bem vinda a surpresa. Sempre. A abertura é dia 25 que é para estarmos de corpo inteiro com a liberdade. A liberdade é fundamental. 

Eu disse na abertura da anterior mostra de Chorão em Setúbal que estávamos perante uma das melhores exposições de sempre na cidade. Esta agora ainda é mais surprendente. Nem sei o que dizer. Talvez isto: esta pintura é do caraças.

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